domingo, 19 de agosto de 2007

V - Chuva II (ou A criança da Chuva)

Corre, escorre, foge, tange
Arranque à força, à ferro
Corre, escorre, carrega contigo
Molhe, debulhe na água da chuva
ingenuo pedido, uma súplica muda
e cortam os olhos as gotas
as facas da chuva que berram
que batem com força na polpa dos olhos
e molham o transtorno com gotas de chuva
e é muda a batida surda no chão

A boca calada, tremida, molhada, lavada
transborda e prossegue e entorna o copo
que vai pelo ralo e torna ao mar
e toma a forma de gotas redondas
que nuvens de luto irão derramar
no percurso cinzento que sombreia o dia

Tu choras porque, oh menina da chuva?
Eu vejo esse pranto os meus olhos banhar
teus olhos de gato, grandes, escuros
refletem o muro de luto, de nuvem
o muro de águas que hão de passar
Não chores menina, não chores a chuva
a chuva por si não dói nem aperta
corre, escorre, lava, carrega
as dores de olhos de gato pro mar.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Vampiro

minha alma grita
se agita
se remoe
se constroe em cima de corpos alheios
se disfaz
é fugaz
no tempo infimo de uma mordida
teus dentes de cão selvagem
em meu pescoço frio de neve
me dilaceram a pele
num gozo, dor animal
me corto em teu punhal
pra a ti nutrir de sangue
te faço pura em pecados
e lacero meu peito e viceras
afim de a ti fundir-se
e tornarme parte pura e nua
de uma alma negra e triste

IV - O musico dos ventos

Silêncio
Guardo as palavras
Intactas
Sopram de minha mente
Latente
Sussurram entre grades e árvores
estáticas, movimento
Penetram pelas brechas
janelas semi-abertas
ouvidos inconscientes
Escutam o sussurro mudo do silêncio
do vento

Por entre a rigidez absoluta
do concreto, da ação do tempo
dança em valsa a melodia
que rodopia, gira, sopra
Por entre janelas silenciosas
por entre prédios e monumentos
que cantam no mesmo tom de silêncio
e guardam as palavras
eternamente intactas
trocadas pela perfeita expressão
contida em tantos ruídos de silêncio.